No vasto contexto das contratações públicas, especialmente aquelas relacionadas aos serviços de publicidade prestados por agências de propaganda, existe uma complexidade frequentemente subestimada tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência. Esta complexidade coloca um desafio prático significativo diante dos agentes públicos encarregados de conduzir tais processos licitatórios. Eles enfrentam uma carência evidente de recursos detalhados e abrangentes que possam oferecer orientação precisa sobre os procedimentos envolvidos nessas licitações.
Além disso, a publicação da IN SECOM/PR nº 1/2023[1] em 19 de junho de 2023, com o propósito de regulamentar a matéria à luz da nova Lei de Licitações e Contratos, a Lei nº 14.133/2021[2], trouxe uma nova camada de complexidade ao cenário. Esta instrução normativa suscitou diversas questões, em particular ao examinar o conteúdo do art. 1º, § 1º, que faz referência à Portaria MCOM nº 3.948/2021[3] para estabelecer definições relacionadas às ações de comunicação. Essas ações de comunicação incluem serviços de Publicidade, Promoção, Comunicação Institucional e Comunicação Digital.
Conforme as diretrizes estipuladas na Instrução Normativa da Secretaria de Comunicação Social, mais precisamente no artigo 1º, parágrafo 1º, impõe-se a necessidade de consultar a Portaria do Ministério das Comunicações, notadamente em seu artigo 2º. Este dispositivo regulamentar destaca a relevância do conceito “Comunicação Social” e a imperativa integração e sinergia entre as distintas vertentes que compõem o universo da comunicação. Essa integração é salientada para demarcar a diferenciação existente entre os serviços de Publicidade, Promoção, Comunicação Institucional e Comunicação Digital.
A Comunicação Social, enquanto disciplina abrangente, engloba a análise e aplicação dos princípios comunicacionais em variados cenários e se desdobra em diversos subcampos, tais como publicidade, jornalismo, design, audiovisual, marketing, produção cultural, rádio e televisão, relações públicas, entre outros. Dessa forma, é essencial reconhecer que a prestação de serviços publicitários por uma agência de propaganda não engloba, necessariamente, todas as competências técnicas requeridas para a execução de atividades específicas de comunicação digital, como a gestão de mídias sociais ou a implementação de estratégias de tráfego pago. Analogamente, não se pode pressupor que uma agência especializada em comunicação corporativa e relações com a imprensa detenha o conhecimento técnico indispensável para a realização de tarefas específicas relacionadas ao marketing promocional (ou live marketing).
Assim, de forma pragmática, com o objetivo de esclarecer a questão relacionada à classificação do objeto de contratação, retornamos nossa análise à Portaria MCOM nº 3.948/2021, especificamente no que diz respeito aos artigos 4º, incisos I, III, V, VI e VII, e também à Instrução Normativa SECOM/PR nº 1/2023, que, em seu artigo 2º, inciso I, alíneas “a”, “b” e “c”, aborda o tema da classificação do objeto relacionado à Comunicação Social a ser contratado, englobando os serviços de Publicidade, Promoção, Comunicação Institucional e Comunicação Digital. As informações serão compiladas em um quadro resumo a seguir, visando sistematizar os dados essenciais para aqueles envolvidos na execução dessas contratações, assegurando maior clareza e acessibilidade.
SERVIÇOS DE PUBLICIDADE PRESTADO POR AGÊNCIA DE PROPAGANDA | |
Critérios a serem observados | Descrição |
Gabarito legal | Lei nº 12.232/2010[4], com complementação da Lei nº 14.133/2021 nos tópicos que fazem referência à Lei nº 8.666/1993[5]. |
Integração vinculante dos serviços | Os serviços de publicidade devem ser realizados de forma integrada, abrangendo o escopo criativo, execução interna, intermediação com fornecedores especializados (serviços externos) e compra de espaços publicitários (veiculação). |
Autorregulação | Sinapro – Sindicato das Agências de Propaganda; e, CENP – Conselho Executivo das Normas-Padrão. |
Cardápio de serviços | Como boa prática, recomenda-se a elaboração de um cardápio detalhado dos serviços a serem prestados pela agência, alinhada ao artigo 2º da Lei nº 12.232/2010 e à tabela referencial do Sinapro do estado em que a instituição pública que realizará a licitação está sediada. |
SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO INSTITUCIONAL PRESTADO POR AGÊNCIA DE COMUNICAÇÃO CORPORATIVA | |
Critérios a serem observados | Descrição |
Gabarito legal | Artigos 20-A e 20-B, da Lei nº 12.232/2010, em conjunto com a Lei nº 14.133/2021; e utilização das boas práticas do Acórdão nº 6.227/2016, da Segunda Câmara do TCU. |
Serviços | Atividades de relações com a imprensa e relações públicas, conforme definido pela Lei nº 14.356/2022, que introduziu os artigos 20-A e 20-B na Lei nº 12.232/2010. |
Autorregulação | Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje). |
Cardápio de serviços | Como boa prática, recomenda-se a elaboração de um cardápio detalhado dos serviços a serem prestados pela agência, com base nos padrões de mercado estabelecidos pela Aberje que servirão como base para a estimativa da contratação, o detalhamento dos itens a serem contratados e as unidades de medida específicas, como a centimetragem usada para a valoração de notícias em assessoria de imprensa. |
SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO DIGITAL PRESTADO POR AGÊNCIA DE MARKETING DIGITAL | |
Critérios a serem observados | Descrição |
Gabarito legal | Parágrafo 1º do artigo 20-A da Lei nº 12.232/2010, em conjunto com a Lei nº 14.133/2021; e utilização das boas práticas do Acórdão nº 6.227/2016, da Segunda Câmara do TCU. |
Serviços | Estratégias digitais, criação, programação e manutenção de páginas eletrônicas, monitoramento e gestão de redes sociais, otimização de páginas e canais digitais para mecanismos de busca. |
Autorregulação | Associação Brasileira de Agentes Digitais (ABRADi). |
Cardápio de serviços | Como boa prática, recomenda-se a elaboração de um cardápio detalhado dos serviços a serem prestados pela agência, com base no “Guia dos Valores de Produtos e Serviços Digitais” da ABRADi como base para a estimativa da contratação, o detalhamento dos itens a serem contratados e as unidades de medida específicas, como CPC, CPM, taxa de conversão, entre outros. |
SERVIÇOS DE PROMOÇÃO PRESTADO POR AGÊNCIA DE MARKETING PROMOCIONAL (OU LIVE MARKETING) | |
Critérios a serem observados | Descrição |
Gabarito legal | Lei nº 14.133/2021. |
Serviços | Técnicas de incentivo e envolvimento de públicos de interesse, com o objetivo de estabelecer e estreitar relacionamentos, fidelizar segmentos de clientes, estimular conhecimento, experimentação, interação, engajamento, incremento de vendas ou propiciar a vivência de situações positivas com marcas, conceitos ou políticas públicas (estratégias como eventos, feiras, promoções, ativações, incentivos e trade marketing). |
Autorregulação | Associação de Marketing Promocional (AMPRO). |
Cardápio de serviços | Os padrões de mercado estabelecidos pela AMPRO servem como base para a estimativa da contratação, o detalhamento dos itens a serem contratados e a medição dos resultados, incluindo métricas como engajamento do público, audiência, interações, NPS (satisfação do público-alvo), entre outros. |
Analisando as minúcias das licitações relacionadas a serviços de publicidade, comunicação e marketing promocional e considerando as mudanças introduzidas pela IN SECOM/PR nº 1/2023, bem como sua compatibilidade com a nova Lei 14.133/2021, emergem questões de extrema relevância.
Em primeiro lugar, é notável a falta de compreensão comum dentro dessas regras, devido às complexidades técnicas envolvidas e à constante evolução no campo da comunicação. Isso ressalta a importância de preparar adequadamente os agentes públicos encarregados dessas contratações e de fornecer diretrizes claras para conduzir o processo licitatório.
A publicação da IN SECOM/PR nº 1/2023, cujo objetivo é regulamentar as licitações na área de comunicação à luz da nova Lei de Licitações e Contratos, trouxe desafios adicionais, particularmente relacionados às definições das ações de comunicação e sua conexão com os procedimentos específicos. Isso destaca a necessidade de uma compreensão profunda do conceito de “COMUNICAÇÃO SOCIAL” e de seu estímulo à integração entre os diferentes subcampos da comunicação.
É fundamental reconhecer que a Comunicação Social abrange diversos subcampos, e os fornecedores contratados devem possuir habilidades técnicas específicas para executar uma variedade complexa de atividades de comunicação. Presumir que uma agência de publicidade pode desempenhar com a mesma eficiência os serviços de comunicação digital ou marketing promocional sem as habilidades necessárias é um equívoco comum. Cada subcampo requer conhecimentos e habilidades distintas, e a licitação deve refletir essa diversidade, a fim de garantir um desempenho eficaz na comunicação pública.
Por fim, o setor público deve ser cuidadoso ao adquirir serviços de comunicação, garantindo que o objeto do contrato esteja de acordo com as especificidades técnicas. As diretrizes da IN SECOM/PR nº 1/2023 representam um avanço na clareza e eficiência das licitações para serviços de publicidade, comunicação e marketing promocional. No entanto, a formação contínua dos agentes públicos e a compreensão das especificidades de cada tipo de serviço são igualmente importantes, especialmente quando se trata da gestão e fiscalização desses contratos, um tema que merece atenção mais aprofundada.
À medida que o setor de comunicação continua a evoluir, impulsionado principalmente pelos avanços tecnológicos que enriquecem esse campo, a necessidade de adaptação contínua às novas regulamentações e melhores práticas torna-se fundamental. Essa abordagem garantirá que o setor público seja beneficiado com os serviços de comunicação de maneira eficaz e eficiente, mantendo como prioridade máxima o atendimento ao interesse público.
Notas
[1] BRASIL. Instrução Normativa SECOM/PR nº 1, de 19 de Junho de 2023. Dispõe sobre as licitações e os contratos de serviços de publicidade, promoção, comunicação institucional e comunicação digital, prestados a órgão ou entidade do Sistema de Comunicação de Governo do Poder Executivo federal – SICOM.
[2] BRASIL. Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021. Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
[3] BRASIL. Portaria MCOM nº 3.948, de 26 de outubro de 2021. Dispõe sobre a conceituação das ações de comunicação do Poder Executivo federal.
[4] BRASIL. Lei nº 12.232, de 29 de abril de 2010. Dispõe sobre as normas gerais para licitação e contratação pela administração pública de serviços de publicidade prestados por intermédio de agências de propaganda e dá outras providências.
[5] BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências.